Justiça do Trabalho anula acordos e condenações por terceirização ilegal Valor Econômico
Por Adriana Aguiar Empresas têm conseguido na Justiça anular condenações e acordos firmados com o Ministério Público do Trabalho (MPT) que tratam de terceirização. As decisões têm como fundamento o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou lícita essa forma de contratação e as leis de terceirização (nº 13.429, de 2017) e da reforma trabalhista (nº 13.467, de 2017). Antes das novas leis e da decisão do STF, as empresas eram frequentemente condenadas na Justiça do Trabalho, em valores milionários. Os juízes aplicavam aos casos a Súmula nº 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que proibia a terceirização da atividade-fim - a parte essencial do negócio. Recentemente, porém, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Campinas -15ª Região decidiu anular acordo judicial firmado entre o MPT e a Usina Santa Isabel e a Santa Luiza Agropecuária, situadas em Novo Horizonte, no interior de São Paulo (processo nº 0010488-92.2018.5.15. 0049). O acordo foi fechado depois de a empresa ser condenada a pagar R$ 1,3 milhão por terceirização considerada ilícita. As empresas assumiram o compromisso de não terceirizar a colheita de cana, bem como não reduzir o intervalo de refeição dos seus empregados para menos de uma hora. O advogado da usina e da agropecuária, Renato Serafim, do Ilario Serafim Advogados, afirma que mesmo com o advento da reforma trabalhista, as empresas permaneciam impedidas de terceirizar suas atividades- fins ou de reduzir o intervalo de refeição, por conta do acordo firmado na ação civil pública com o MPT. Enquanto suas concorrentes, submetidas às leis atuais podiam investir na terceirização, acrescenta, "a empresa [usina] estava engessada, perdendo competitividade no mercado". Com o fim do acordo, segundo o advogado, poderá terceirizar a colheita mecanizada, que exige equipamentos de alta tecnologia. "Agora, a empresa poderá expandir sua atividade principal de cultivo de cana de açúcar e gerar novas oportunidades de negócios e empregos na região." Em tese, diz Serafim, todas as empresas que firmaram acordos com o MPT estão obrigadas a cumprir os termos previstos no texto, ainda que a legislação atual permita a terceirização ampla. A advogado afirma que, antes de recorrer à Justiça, entrou em contato com o procurador do caso em Araraquara, que se negou a rever o acordo. Em Minas Gerais, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) já deu pelo menos quatro decisões para rever condenações praticamente definitivas, pouco antes da fase de pagamento (execução). Nesses casos, as companhias têm usado um instrumento processual previsto nos parágrafos 12 e 14 do artigo 525 do novo Código de Processo Civil (CPC), de 2015, chamado de exceção de pré-executividade, que possibilita a anulação de título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional. Como na época em que o Supremo julgou o tema da terceirização (RE 958.252 e ADPF 324), em agosto de 2018, ainda não havia sido emitida a certidão de trânsito em julgado (quando não cabe mais recurso), os advogados decidiram entrar com pedidos para anular as condenações, o que tem sido confirmado pelo tribunal. Em um dos casos, uma instituição financeira, ligada a um rede de supermercados, conseguiu se livrar do pagamento de R$ 175 mil a uma trabalhadora. O processo foi movido por uma ex-funcionária que oferecia o cartão de crédito do banco para os clientes da rede de supermercados. Ela alegou que era ilicitamente terceirizada e na verdade trabalhava para a instituição financeira como correspondente bancária. Em primeira e segunda instâncias, a terceirização foi considerada ilícita. Foi reconhecido o vínculo de emprego com o banco e determinado o pagamento de horas extras pelo fato de a jornada de bancário ser menor, de cinco horas. Ela cumpria oito horas. A decisão foi mantida no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Contudo, como o julgamento do Supremo ocorreu no dia 30 de agosto de 2018 e a certidão de transito em julgado (quando não cabe mais recurso) no caso só foi emitida no dia 22 de fevereiro deste ano, a 7ª Turma do TRT foi unânime ao entender pela anulação da condenação, mantendo o entendimento proferido pelo juiz Jésser Gonçalves Pacheco, da 5ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (agravo de petição nº 0010226-84.2016.5.03.0005). Na decisão, a relatora, desembargadora Cristiana Maria Valadares Fenelon, destaca que a jurisprudência no TRT mineiro tem caminhado neste sentido. Ela cita mais três decisões recentes que reverteram condenações. Segundo os advogados que assessoram a instituição financeira no processo, Caio Madureira e Rodrigo Macedo, do Tortoro, Madureira e Ragazzi Advogados, "a decisão é de extrema importância" porque é de um tribunal que historicamente entendia pela ilicitude da terceirização. "Por isso, comemoramos a decisão", diz Madureira. Procurado pelo Valor, o advogado da ex-funcionária, Wagner Santos Capanema, informou que ainda está analisando a decisão para avaliar se vai recorrer. Na opinião do procurador Paulo Joarês, coordenador nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho do MPT, nas ações em que a sentença não transitou em julgado há aplicação imediata do entendimento do STF. Mas, acrescenta, é prudente que a Justiça do Trabalho aguarde a finalização do julgamento. "Até esse momento sequer ocorreu a publicação do acórdão", diz. Isso porque, em muitos casos, segundo Joarês, será necessário fazer a distinção entre o precedente do STF e as situações dos processos. Sobre a revisão de acordos, o procurador afirma que é preciso avaliar com cuidado cada caso. "Em muitos deles poderá ser adequado substituir as obrigações previstas, para ajustá-los ao teor da nova lei", diz. Ele destaca que "é preciso observar tanto os limites da decisão do STF, que discutiu apenas possibilidade de terceirizar qualquer atividade, como prestação de serviços entre empresas, mas não legitimou fornecimento de mão de obra, bem como os requisitos da Lei nº 6019/74, que exige uma efetiva transferência de atividades de uma empresa para a outra, a qual deve ter autonomia operacional, capacidade econômica e dirigir o trabalho de seus empregados com exclusividade".
20/08/2019
|
Empresas ainda não se adaptaram à lei de dados Valor Econômico
Por Beatriz Olivon A um ano da entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (nº 13.709, de 2018), boa parte das empresas ainda não se adaptou ao texto. Em levantamento com cerca de 250 companhias de médio e grande porte, o escritório Viseu Advogados identificou que 46% delas ainda nem iniciaram o processo e, em muitos casos, não há sequer previsão. Advogados da área afirmam que o processo de adequação é demorado. A lei traz regras sobre compartilhamento de dados de consumidores e impede que sejam divulgados sem autorização, com previsão de pesadas penalidades - desde advertência até multa de 2% sobre o faturamento da empresa, com teto de R$ 50 milhões por infração. Coordenador da pesquisa, o advogado Gustavo Artese, sócio do Viseu Advogados, destaca que a lei tem prazo de dois anos para entrar em vigor. Geralmente, o prazo é de um ano. "É para as empresas se prepararem porque é uma mudança muito significativa no dia a dia delas", diz. Pela pesquisa, em 27% das empresas, os departamentos jurídicos vão liderar o processo de adaptação. Em 19% será o setor de TI e em 17% o de compliance. Primeiro, de acordo com especialistas, a empresa precisa de uma "fotografia" da gestão de dados atual para depois implementar controles e ajustar o que não estiver de acordo com a lei. Será mais fácil para as que lidam com menos dados - só com os dos próprios funcionários, por exemplo. Mas é mais exigente para as que também têm clientes e parceiros de negócios ou dados sensíveis, como hospitais. "Se deixar para a última hora, vai [a empresa] ter problema", afirma a advogada Rubia Ferrão, do escritório Pigão, Ferrão e Fioravante Advogados Associados. O processo, acrescenta a advogada, envolve a procura por profissionais para auxiliar na adaptação à nova lei, que ainda é pequena, além da adequação de sistemas. Para Rubia, o problema mais grave está ligado ao vazamento de informações, que pode gerar um dano irreparável ao consumidor. "O titular corre o risco de sofrer fraude", diz. O desvio de finalidade no uso dos dados também foi destacado pela advogada. Hoje, a forma como é feita a coleta de dados não envolve o consentimento do usuário, segundo Guilherme Farid, chefe de gabinete do Procon-SP. Com a lei, a autorização deverá ser dada por escrito e, se for considerada abusiva ou enganosa, poderá ser considerada nula. A norma, afirma ele, soma-se ao Código de Defesa do Consumidor, "não compete com ele". Os atuais termos de uso, que os titulares de dados costumam não ler, poderão ser considerados inadequados. A lei exige que o consentimento seja livre, informado e inequívoco. Além disso, há previsão de que os consumidores poderão solicitar quais dados poderão ser compartilhados. "Não adianta achar que vai pegar 20% do tempo de um advogado de consumidor e contratos e falar para ele alterar alguma coisa e ver se a empresa se adapta", afirma Alexandre Pacheco, professor e coordenador do Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da FGV Direito SP. Com a lei, destaca, as empresas passam a ser fiéis depositárias de dados pessoais. "Não adianta pensar que os dados dos clientes são patrimônio da empresa", diz Pacheco. Por isso, as companhias precisam realizar um programa de tratamento de dados e não uma ação pontual, procedimento parecido com o que foi adotado após a entrada em vigor da Lei Anticorrupção (nº 12.846, de 2013). Ainda está pendente a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, que irá lidar com a proteção de dados pessoais e segredos comerciais e industriais. O que não impede, segundo o professor, que as empresas já se preparem.
|
20/08/2019
|
Mercado de criptoativos traz novo desafio à CVM Valor Econômico
Por Graziella Valenti O mercado de criptomoedas ampliou os desafios da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), apesar de não ficar sob sua supervisão. A dificuldade de compreensão de novos ativos tecnológicos, misturada à disseminação da informação de que se trata de um mercado não regulado, fez disparar a oferta de aplicações em criptoativos com rentabilidade prefixada. Essas oportunidades exigem atenção redobrada dos investidores, pois nem sempre esses produtos estão dentro da lei. As criptomoedas não são reguladas, mas a oferta pública de produtos com esses ativos, para captação de recursos, fica, sim, sob supervisão da autarquia. Em pouco mais de um mês, a xerife de mercado elevou de 250 para 300 o número de apurações, fruto de queixas de investidores, que espera realizar neste ano, relacionadas ao que chama de "mercado marginal", de produtos não regulados ou não registrados. O superintendente de orientação e proteção ao investidor da CVM, José Alexandre Vasco, afirmou ao Valor que o total de casos apurados em 2014 foi de 47. Com a nova estimativa para este ano, significa que as queixas de produtos irregulares devem alcançar 32% de todo total de reclamações levadas até a autarquia em 2019, contra 10% há cinco anos. Vasco explicou que não importa onde os recursos dos investidores serão aplicados nem se a captação é feita em dinheiro, criptomoedas ou qualquer outro bem. Desde que a oferta signifique, para o aplicador, o direito de participar do retorno obtido pelo esforço de um terceiro, a atuação deveria ser registrada na CVM e pode estar submetida às investigações do regulador, conforme o artigo 2º, inciso 9, da Lei 6.385, de 1976. O superintendente afirmou que os novos desenhos estão exigindo a reavaliação do melhor entendimento do que é contrato de investimento coletivo (CIC), que é como a lei denomina tais produtos. Quando um investidor aplica recursos em um banco, corretora ou outro intermediário regulado pela CVM e pelo Banco Central (BC), o cliente fica protegido pelas regras e atuações dessas entidades. Nos casos em que o produto não é regulado nem a instituição, a única alternativa é a fiscalização pelo próprio usuário. "Nessas situações, quando há problemas, são as partes privadas que devem resolver as questões no Judiciário", disse ele. Na semana passada, a CVM determinou que a Atlas Quantum, que fazia anúncios em rede nacional de televisão, e seu sócio Rodrigo Marques do Santos, deixassem de fazer oferta de CIC - como classificou a oferta que prometia retorno com base na arbitragem de criptomoedas. Não foi nem a primeira, nem a única alvo da autarquia. Outro caso recente envolvendo criptoativos foi da Unick Forex, que também apostava em contratos cambiais. Vasco explicou que para fornecer parâmetros de funcionamento e ao mesmo tempo não coibir a inovação a CVM vai desenvolver e implantar um sistema de "sandbox" regulatório, em parceria com a Secretaria Especial de Fazenda do Ministério da Economia, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) e o BC. Quando implantado, permitirá licenças temporárias e criará um espaço sob supervisão dos reguladores para o teste de produtos e modelos de negócios com caráter inovador, sem incorrer inicialmente em todas as consequências da regulação vigente. O termo "sandbox" significa, em tradução livre, caixa de areia, como os locais em parques e praças nos quais os pais deixam as crianças brincarem livremente, mas dentro de um espaço delimitado.
|
22/08/2019
|
Governo paulista reabre parcelamento de ICMS-ST Valor Econômico
Laura Ignacio As empresas paulistas poderão parcelar, até o fim do ano, débitos do ICMS-ST - recolhido antecipadamente por meio do regime de substituição tributária. A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo reabriram o prazo de programa, encerrado em maio, para o pagamento de dívidas em até 60 vezes. Ao se regularizarem pelo parcelamento, os contribuintes tributados por meio desse regime - em que uma empresa antecipa o recolhimento do imposto em nome das demais da cadeia produtiva - ganham em competitividade, segundo a PGE. Por isso, o órgão alerta que depois adotará medidas mais radicais de cobrança. "Após dar duas chances aos contribuintes, o Estado não pode deixá-los na mesma condição", diz Alessandro Junqueira, procurador do Estado e coordenador do Grupo de Atuação Especial para Recuperação Fiscal. Na primeira etapa, 1.556 adesões resultaram no parcelamento de R$ 627,74 milhões somente com a PGE. "Agora, pretendemos arrecadar pelo menos o dobro." Já a Fazenda paulista registrou na primeira fase do parcelamento 1.613 adesões para inclusão de débitos não inscritos na dívida ativa. Um total de R$ 14,9 milhões já foram arrecadados e R$ 85,1 milhões serão pagos via parcelas. "A reabertura faz parte da estratégia da secretaria de abrir uma nova janela de oportunidade para os devedores de ICMS-ST se autorregularizarem e voltarem à conformidade", afirma o órgão por nota. Vários contribuintes que não conseguiram se organizar para se regularizar na primeira oportunidade pediram a reabertura do prazo, segundo Elaine Motta, chefe da Procuradoria da Dívida Ativa. "E, com a aprovação da reforma da Previdência, haverá maior expectativa do mercado se aquecer ", diz. O estoque da dívida ativa do Estado é de R$ 13,28 bilhões e há um total de 12 mil devedores de ICMS-ST, dos mais variados segmentos, inscritos na dívida ativa. Apesar do parcelamento não conceder descontos e as parcelas não serem tão numerosas quanto as dos programas federais (Refis), advogados afirmam que a medida é atrativa por permitir a inclusão de ICMS-ST não pago até 31 de dezembro deste ano. Na prática, as empresas podem até deixar de pagar o imposto agora para engordar o caixa. Contudo, devem levar em conta que o parcelamento exige uma entrada de 5% e as prestações serão corrigidas pela Selic. De acordo com Felipe Dalla Torre, do Peixoto & Cury Advogados, a notícia sobre a reabertura do parcelamento foi bem recebida por uma empresa cliente. "Porque ela quer incluir débitos que surgiram após a primeira linha de corte, que era setembro de 2018", diz. Para ele, vários outros contribuintes ficarão interessados. "Isso porque se a empresa incluir um débito agora e surgir outro até 31 de dezembro, poderá incluí-lo também. Não há restrição à quantidade de parcelamentos." Depois da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que considerou crime de apropriação indébita o não pagamento do ICMS-ST, segundo o advogado Rodrigo Rigo Pinheiro, do Leite, Tosto e Barros Advogados, as empresas ficaram mais preocupadas. "Por isso, interessa mais pagar em parcelas do que discutir na Justiça um crime tributário, evitando um constrangimento penal", afirma. Contudo, o advogado destaca que, no caso de parcelamento de débito não inscrito na dívida ativa, será necessário apresentar garantia (fiança bancária ou seguro de obrigações contratuais). Será um grupo de procuradores, destacado para atuar exclusivamente na chamada unidade de cobrança qualificada da PGE, que trabalhará para recuperar o ICMS-ST de quem não se regularizar por meio do parcelamento. "O grupo foca nos devedores contumazes. Grandes débitos têm sua origem no ICMS-ST", diz Alessandro Junqueira. A unidade foi criada para agilizar os procedimentos desses casos e, assim, tentar driblar a lentidão processual causada pela alta demanda do Judiciário, acrescenta o procurador. Na prática, isso é feito por meio de pedidos de penhora, por exemplo. Para definir as empresas-alvo, segundo ele, a PGE tem critérios próprios de classificação: nível de atividade, faturamento, origem, tipo e valor do débito, se há garantia do pagamento na ação de judicial de cobrança (execução) para caso de derrota e se a dívida está parcelada. Enquanto a empresa estiver no parcelamento, as ações de cobrança fiscal contra ela ficam suspensas (sobrestadas). Para a procuradora Elaine Motta, a adesão indica a postura do contribuinte de querer resolver o seu problema tributário. "Mas ele tem que liquidar a dívida e não adianta parcelar um débito, se existirem outros em aberto." De acordo com ela, na primeira fase foram verificados casos de adesão por empresas sob acompanhamento da unidade qualificada. "E isso alterou a classificação no rating da PGE", afirma. Mas no momento em que a empresa rompe o parcelamento, um sistema avisa a unidade e é feito pedido de prosseguimento da execução fiscal. "A adesão não pode ser feita apenas para sair do radar do Estado."
|
|